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Uma Ideia Toda Azul - um conto sempre novo


          Não me recordo quando eu li essa história, ou o que me levou a parar e apreciar esse conto. De qualquer forma, é uma das narrativas que mais me fizeram pensar sobre o futuro.
          Marina Colasanti a publicou em 1978. Como tantos outros escritos, este também é atemporal. Curiosamente, é o tipo de leitura facilmente encontrado em atividades de ensino fundamental, mais um exercício de interpretação de texto.
          Antes de pesquisar mais a fundo, de descobrir a autoria e reler a história, eu a recordava de uma maneira diferente. Isso acontece com a maioria das memórias longa e profundamente enterradas em nossa mente. Nossa percepção é nublada pela emoção envolvida. Se eu, como adulta, aprecio as recordações de quando criança, é bem provável que eu pense nelas com mais carinho e com menos certeza dos fatos do que alguém que não considerava esses anos tão dourados.
          Em suma, eu "lia" o conto por meio de uma lente embaçada. "Uma ideia toda azul" é sobre um rei havia tido uma ideia, e ao de deparar com ela, a considerou brilhante e azul. Ele a estimou muitíssimo, com medo de que alguém a roubasse, decidiu escondê-la, trancá-la num cômodo e mantê-la em segredo. Isso funcionou para o rei, porém eventualmente, após o passar de duros anos, ele decidiu visitá-la. Quando ele viu que a ideia não havia mudado enquanto ele próprio houvera envelhecido, ele não mais via sentido. Não teve mais a mesma graça, pois agora era outro homem, com outra mente, outros conceitos e muita idade. O rei, então, chorou e guardou novamente a ideia, porém com a certeza de que seria a última vez que iria vê-la.
         Esta é a versão "clara" do conto, que eu escrevi logo após a leitura do mesmo. Ainda assim, neste momento, não sei se prefiro a versão original ou a versão encorpada e envelhecida que minha mente me levou a pensar que era a verdadeira. Lembro de ter lido em páginas com fonte grande e gravuras, obviamente voltado para crianças. Eu acreditava que o rei havia sido avarento ao guardar a ideia para si, e incrivelmente pretensioso e paranoico ao considerar a ideia brilhante o suficiente para que alguém se interessasse por ela. É claro, eu era criança e não sabia que eu pensava deste jeito, com estas palavras. De um determinado modo, conceitos são abstratos quando desconhecemos que eles já existem por aí, com nome, exemplificação e constante uso em geral.
         Quando a ideia ocorreu ao rei, no momento que estava andando em seu jardim, imediatamente pensei em Newton, ou melhor dizendo, "no carinha que estava debaixo de uma árvore, de onde caiu uma maçã, o que provocou uma ideia revolucionária no campo da física". Considerei isto por um momento, a audaciosa semelhança, mas cheguei à conclusão de que nada igualmente genial havia sido projetado pelo rei. O homem, em sua mais enraizada faceta, é orgulhoso demais para abrir mão de ser reconhecido.
         Então, talvez o motivo secreto dele não seja tão importante. Toda essa introspecção é apenas mais uma forma de se distrair, mais uma pilha bem dobrada de roupas que gostamos de desarrumar. Mas também é necessário admitir, por um momento, que adiar resoluções, se demorar em justificativas e fazer tempestades em copo d'água também são, em síntese, como esconder ideias. Conceitos podem ser imutáveis se bem guardados, mas pessoas não.
         Creio que uma boa conclusão seria dizer que uma decisão hoje pode não fazer diferença amanhã se não for acompanhado de uma ação. No fim, se a ideia não somar, ela some.
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