“Qual é a sua estrada, homem? A estrada do místico, a
estrada do louco, a estrada do arco-íris, a estrada dos peixes, qualquer
estrada... Há sempre uma estrada em qualquer lugar, para qualquer pessoa, em
qualquer circunstância”. Kerouac (1922-1969), On the Road.
É um clichê dizer que quem lê, viaja! No entanto é
esta sensação que a leitura de On the
Road de Jack Kerouac nos proporciona. Temos a sensação de pegar a estrada
na companhia do autor, mesmo que por meio do personagem Sal Paradise. Ao longo
do livro, somos também questionados, “qual
é a sua estrada homem?”, a pergunta nos convoca a pensar em nossos próprios
caminhos, inclusive ao ler o livro, quando os nossos olhos refazem os passos do
viajante Sal.
O livro de Kerouac teve enorme repercussão,
inspirou e ainda inspira músicos, poetas e escritores. É um símbolo da chamada geração
beat, grupo de escritores da década
de 1950 e influenciou a contracultura norte-americana dos anos 1960, atravessando
as fronteiras do país e do tempo. Conhecido como bíblia do movimento Hippie, o
célebre livro ainda causa fascinação para quem tem o prazer de viajar por suas
páginas.
Capa de On the Road desenhada pelo autor.
Apesar de
um texto de ficção, o livro é também relato das experiências pessoais do autor,
vivências de quando Kerouac iniciou suas andanças pelo país em 1947, em alguns
momentos caminhando, dirigindo ou pegando caronas. No livro o autor narra
situações, conhece pessoas e visita cidades através da figura do narrador Sal
Paradise, um jovem escritor reservado que vive em Nova York. Paradise teria
iniciado um novo rumo para sua vida no momento em que conheceu o libertário
Dean Moriarty, um jovem problemático e desregrado, mas que possui intenso amor
pela vida e pela aventura. O personagem Dean teria sido inspirado em Neal
Cassady, amigo de Kerouac. Instigado por Moriarty o jovem escritor Sal Paradise
sai da cidade e começa sua vida na estrada.
O livro foi publicado em 1957 nos Estados Unidos pela editora Viking.
Volume original do livro no Museu das Letras e Manuscritos, Paris, 2012.
A escrita
de On the Road teria sido feita de
forma frenética, de uma só vez em poucos dias, em pleno fluxo criativo. O volume
original não apresenta parágrafos, e foi digitado em um rolo único de papel. O
formato original, bem como a capa desenhada teve rejeição por parte das
editoras, nela o autor assinava ainda como John Kerouac, seu nome de batismo
era Jean-Louis Lebris de Kerouac, possuía origem franco-canadense. On the Road só foi publicado 10 anos
depois. A escrita de Kerouac se conecta com a de autores com o qual se
relacionava, era a chamada geração beat
que se caracterizou por uma escrita fluída, pelo uso de gírias e até palavrões,
rompendo com uma escrita conservadora. O movimento emergiu nos Estados Unidos
após a Segunda Guerra Mundial, ganhou popularidade na década de 1950, momento
de prosperidade econômica, quando os louvores de uma sociedade tecnicista e os
valores tradicionais de família, religião e moral estavam em alta
personificados pelo American Way of Life.
Na contra mão desses ideais, os beats propunham através de sua escrita,
novos padrões sociais, formas alternativas de viver e se relacionar com as
pessoas, relações livres que misturavam sexo e amizade e se contrapunham aos
parâmetros tradicionais ligados a sociedade burguesa e a rotina capitalista
industrial. Foi um movimento feito por jovens escritores que pregavam a
liberdade, o desregramento, uma forma aberta de lidar com a vida, regada ao som
do Jazz.
Kerouac em sua mesa de escrever com o rolo do volume original, 1951.
O livro de
Jack Keroauc evidencia desde o título a noção de estrada, um espaço físico e
simbólico ligado à ideia de mobilidade e de trânsito. O espaço da estrada é
marcado pelos contatos humanos que o autor vivencia pelo caminho, reafirmando a
ligação do espaço com as relações humanas. A estrada é o ponto central,
representa um modo de vida marcado pelo movimento em contraposição à fixação, a
casa e o trabalho, responsabilidades ligados aos valores burgueses do American Way of Life. A estrada emerge
como uma metáfora para a vida que se modifica constantemente, ela é espaço de
circulação, do rumo incerto, da alma errante, do nômade....se você não leu,
corra e comece já! Percorra a estrada de Kerouac e faça a sua estrada.
Referências:
KEROUAC,
Jack. On the road. Porto Alegre: L & PM pocket, 2003.
PASSERINI, Luisa. A juventude, metáfora da mudança social. Dois debates sobre os
jovens: a Itália fascista e os Estados Unidos da década de 1950. In: Giovanni
Levi e Jean-Claude Schmitt (orgs). História dos jovens 2: a época
contemporânea. São Paulo: Companhia das Letras, 1996.
ROSZAK, Theodore. A Contracultura: reflexões sobre a sociedade tecnocrática e a
oposição juvenil. Petrópolis: Editora Vozes, 1972.
TOTA, Antonio Pedro. O imperialismo sedutor: a americanização do Brasil na época da
Segunda Guerra. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.
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