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O Amar Demais I - O Lado Franco da Moeda


          Vamos começar dizendo que o amor é aquela moeda com a qual você quis fazer truques quando criança (ou ainda treina esses truques, mas, hey, sem julgamentos); você a queria fazer desaparecer numa hora, e na outra a fazia surgir em algum lugar preferencialmente embaraçoso. Pois bem, você conseguiu; apenas, como tantas outras facetas da vida, não do jeito que você queria.
          Apenas o fato de ter encontrado o amor, ter feito essa peripécia [macumba] de se permitir doar-se já é incrivelmente fascinante [e ironicamente estúpido; vide história da humanidade].
          Veja bem, não digo isso em base na minha experiência atual, mas em minha vasta carreira de mediadora de relacionamentos. Então, acredite, é super beleza poder amar, mas hiper destrutivo se você se deixar levar. Mas voltemos à parte onde digo que amar é legal [se é que eu direi isso].
          O amor, seja por familiares, amigos ou terceiros [neste último grupo contém pessoas que eventualmente irão te jogar na lama] é fundamental para auto-descoberta. Quando a dependência é elucidada, sua mente entra em colapso com o coração [famoso mind-blown] e é possível enxergar as coisas que somos capazes de fazer por outros que não podemos fazer por nós mesmos (ou que nunca fizeram por nós).
          O amor deve ser romântico, no sentido original da palavra. Romance é sobre o "eu", o sinônimo mais sincero do egoísmo. Supostamente, tal elemento deveria ser o maior conhecedor do sujeito em si, sendo, portanto, desnecessário qualquer outro adjacente. Porém, esta peça de sabedoria obrigatória não faz parte da configuração default do ser humano, mas sim uma habilidade que deve ser desbloqueada ao longo da vida.
          Alguns aprendem cedo e de maneira brusca, outros simplesmente aceitam o que lhes foi entregue e não questionam a veracidade daquele pedaço de afeição, ou se é pura fachada para outros fins. Eu realmente preciso dizer que a primeira opção é a que merece atenção? Até mesmo o desafeto nos ensina a amar.
          Diariamente nos são dadas várias escolhas referentes ao modo de lidar com o passado. De maneira alguma o esquecimento dever ser o método usado para cura. A lembrança, na verdade, é nossa melhor aliada; não só é um registro do que foi dito e feito, mas também um teste particular. Se, ao ressuscitar alguma memória, não houverem sentimentos anexados a ela, então saberemos que essa parte do passado já virou história, e que poderá ser usado fins futuros sem prejudicar a situação presente. Isso, creio eu, é chamado de amadurecimento [ou get over].
          O amor que pode nos prender é o mesmo que pode nos libertar. O auto-conhecimento é um dos presentes que tal elemento pode nos dar sem estragar as coisas boas que guardamos. Mesmo após o fim de um relacionamento, é possível olhar trás com o olho da mente e enxergar os bons momentos, colher os frutos da felicidade e rejeitar qualquer mácula que possa ter sido parte do motivo do término.
          A verdade é que, independente de como terminar (presumindo que você terá o infortúnio de ter um fim), tudo é um aprendizado. A atração, a interação, a continuidade, a paixão, o tenro amor... tudo é lição, quer queiramos ou não. Quantas vezes rejeitamos a ideia de ter aprendido algo apenas pelo saber de que, para ter clareza, para ter amadurecido, termos que ter tido dor, e desilusão, e mágoa, e confrontado nós mesmos? Já esperamos por isso. Desde a menor das intuições, a pausa entre olhares, a hesitação declarada - a mente já te perturba com possibilidades enquanto o coração se afunda de prazeres.
          Este é o lado honesto e ríspido que precisamos reconhecer antes de sequer explorar as margens do amor que vale a pena adentrar. Então, antes de todo pedaço de carinho, atenção, honestidade, cuidado, antes do bem-bom e do "acho que é com essa pessoa que eu quero viver", temos que admitir que haverá o "como eu pude ter me doado tanto para alguém assim?". Encerro este pensamento com esta inquietante verdade:

A experiência é uma professora cruel. Mas você aprende, meu Deus, como aprende.
                                                                                                                           - C. S. Lewis
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