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Reflexões literárias: Berenice



Edgar Allan Poe foi um escritor americano, nascido no século XIX, para ser mais exato, em 19 de janeiro de 1809, em Boston, Massachusetts. Hoje é reconhecido por praticamente inventar o gênero ficção policial, e por dar grandes contribuições à ficção científica. Seus contos, sobretudo, os que aqui serão resenhados, são conhecidos por um horror psicológico e trazem uma característica que está presente na mentalidade do indivíduo da contemporaneidade, de uma certa contemporaneidade, a vergonha do medo e da superstição e o credo na razão, na explicação racional, mesmo diante de fatos (no momento ou à primeira vista) inexplicáveis.

Berenice
[contém spoilers]
 
Uma prima, uma bela obsessão, o horror, e a confusa desilusão entre a vida e a morte. Esta é Berenice, esta é ela para o narrador-protagonista que se faz presente, e desta vez tem nome, e se chama Egeu. O narrador sofria de uma doença mental. Dispunha de pouca noção para diferenciar o real do sonho, e por vezes sofria com uma compulsória e passageira obsessão. Seu estado era grave, de modo que poderia passar horas repetindo uma única palavra a partir do momento que sua mente fixasse nela. Era um estado consciente, mas incontrolável, como um sonho, como quem sonha ainda acordado. O conto expõe um problema humano, a mente doente de seu narrador. A narrativa revela que uma trágica doença se apossara de Berenice e sua morte parece certa.

[...] ao erguer o rosto, descobri que minha prima partira do aposento. Mas do desordenado aposento de minha cabeça, ai de mim!, não partira, nem era expulso, o espectro branco e fantasmagórico de seus dentes. [...] Os dentes! - os dentes! - estavam aqui, e lá, e por toda parte, e visivelmente palpavelmente, diante de mim; [...] [POE, Edgar. Contos de imaginação e mistério. Editora Tordsilhas. Kindle e-book. posição 2765]

Egeu desenvolvera uma obsessão pelos dentes da prima, e mesmo diante da morte dela, os seus dentes atormentam sua mente. Na tentativa de fuga, sua obsessão toma conta e ele perde a consciência. Nesse momento a narrativa traz não o horror dos fatos, mas o horror da própria mente, um horror psicológico, a perda da consciência diante de uma obsessão.
Retoma a consciência e o controle. O túmulo de Berenice fora violado, ela ainda estava viva afinal, mas seus dentes foram todos arrancados. Em egeu, marcas de conflito,
em seu quarto uma pá, ferramentas odontológicas e uma maleta com 32 dentes brancos, dentes de Berenice. Há narrativa por fim revela, não há horror fantasmagórico, há apenas uma horrenda realidade, uma tragédia plausível, um horror psicológico, nenhum fantasma, mas um indivíduo psicologicamente instável, Egeu. Sua obsessão doentia o consumiu, ele arrancara cada um de seus dentes sem nem se dá conta disso, sem nem se dá conta de que ela ainda estava viva. Quando a trama se conclui e os fatos podem ser analisados como um todo, existe apenas a verdadeira e horrível realidade. O problema psicológico de Egeu é a base do conto. Há horror, mas não há sobrenatural. Apenas uma infeliz doença. Apenas uma trágica causa-consequência, característica dos contos de Poe.

 Berenice é apenas mais uma vítima da obsessão humana. No conto, obsessão doentia. Na vida real, talvez menos trágico, mas nada mais comum. A vontade para obter algo, ou mesmo, para que algo seja verdadeiro, por vezes se faz tão forte que nos cega. Talvez em cada um de nós, não seja uma doença psicológica, mas certamente, é uma cegueira doentia. Ignoramos a realidade, apenas para que o desejo se cumpra. E o pior, fazemos isso em diversas situações cotidianas sem nem nos darmos conta. Seja na educação, na política, no amor, por vezes estamos dispostos a ignorar os fatos para que tenhamos razão, e esta, incoerentemente, nossa obsessão. Para termos razão, para que nossos desejos sejam cumpridos, nos tornamos irracionais, e somos capazes de arrancarmos nossos próprios dentes.
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1 comentários:

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12 de abril de 2015 às 11:44 ×

Caramba, que belíssimo texto!

Congrats bro Marketing Digital you got PERTAMAX...! hehehehe...
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